Descoberto o planeta Mongo!

Quando astrônomos anunciaram a descoberta de um planeta num sistema estelar binário, o ângulo que a mídia achou para promover a história (muito interessante em si mesma) foi fazer uma comparação entre o mundo recém-descoberto, Kepler-16(AB)-b, com Tatooine, o planeta natal da família Skywalker, na saga de Guerra nas Estrelas. Uma "interpretação artística" de como seria a vista a partir de uma posição em órbita do tal planeta aparece abaixo, cortesia da Nasa:


Os cientistas responsáveis pela descoberta foram claros em dizer que o mundo que haviam encontrado era um gigante, semelhante a Saturno, e provavelmente inabitável, mas um funcionário da Industrial Light & Magic, empresa responsável pelos efeitos especiais nos filmes de George Lucas, não se fez de rogado ao ser convidado a dar um palpite sobre a descoberta:  "É possível que haja um verdadeiro Tatooine por aí".

O que pouca gente sabe, ao menos fora da Nerdlândia, é que uma das principais fontes de inspiração dos filmes de Guerra nas Estrelas foram os quadrinhos de Flash Gordon, desenhados originalmente pelo americano Alex Raymond entre as décadas de 30 e 40 do século passado. Gordon é um atleta, jogador de polo e lutador de jiu-jitsu, que é lançado ao espaço, junto com namorada e um cientista maluco, para tentar desviar um planeta errante que se encontrava em rota de colisão com a Terra.

O tal planeta, Mongo, é governado por um cruel imperador, Ming, e habitado por vários tipos de espécies fantásticas, incluindo homens alados, abomináveis homens das neves, homens-lagarto, plantas carnívoras e monstros sortidos. Abaixo, a primeira página da primeira aventura de Flash, em que a colisão iminente com Mongo é anunciada (abstenho-me de comentar a manchete "Só um milagre nos salvará, diz a ciência") e onde Flash e Dale Arden são recrutados, sob mira de revólver, para ajudar o Dr. Hans Zarkov a deter o planeta letal:


Recentemente, o Observatório Europeu Meridional, ESO, divulgou a descoberta de um planeta errante relativamente próximo ao Sistema Solar (está à bagatela de 100 anos-luz. Em termos cósmicos, ali na esquina). Embora este seja, de acordo com a nota divulgada pelo observatório, o "mais sério candidato" à categoria de planeta desgarrado, que vaga ao léu pelo vácuo do espaço, não se trata, de modo algum, do primeiro. Artigo publicado ano passado na revista Nature dava conta de que a população de planetas independentes no céu pode ser até duas vezes maior que a de estrelas!

Catalogado sob o nome pouco elegante de CFBDSIR2149, o planeta anunciado pelo ESO está para Mongo assim como Kepler-16(AB)-b está para Tatooine. Claro,  Kepler-16(AB)-b é grande demais para ser habitável por formas de vida semelhantes às que temos na Terra e CFBDSIR2149, além de ser grande demais, não está em rota de colisão conosco, mas quem liga?

É possível argumentar que a existência de um "Mongo" real por aí é ainda mais improvável que a de um "Tatooine". Afinal, um planeta errante é um planeta sem ligação gravitacional com estrelas próximas e, sem uma estrela para aquecê-lo, como ele poderia desenvolver vida? Talvez tenha uma fonte interna de calor, alimentada por pressão gravitacional ou decaimento de elementos radioativos, mas é improvável que esse calor seja suficiente para sustentar reinos selvagens, imperadores malignos e, por último mas não menos importante, lascivas princesas seminuas.

A origem desses planetas errantes ainda é um mistério -- a teoria dominante hoje propõe que planetas e estrelas nascem virtualmente juntos, a partir da condensação de nuvens de poeira cósmica, e juntos permanecem -- mas é possível que, na complicada interação gravitacional entre os planetas de um sistema recém-formado, algum deles acabe sendo expelido para longe da família.

O plot da colisão iminente entre Mongo e a Terra desaparece rapidamente das tirinhas de Flash Gordon, por falar nisso. Nosso herói logo se vê às voltas com problemas muio mais urgentes, como escapar de uma arena cheia de tigres famintos e salvar sua amada Dale dos braços do imperador maligno. 

Aliás, não me lembro de as histórias originais sequer mencionarem onde Mongo teria ido parar, depois de tirar sua fina do nosso sistema solar. Não me parece que tenha se estabilizado em órbita do Sol. Talvez tenha caído num buraco de minhoca e hoje esteja, digamos, a uns 100 anos-luz daqui?

Abaixo, ilustração do planeta "Mongo", ou CFBDSIR2149:


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