Para quem você está falando?
É mais fácil sensibilizar pessoas de ideologia conservadora
para os riscos da mudança climática apontando diferenças entre o presente e o
passado do que apelando para o futuro, diz um conjunto de seis experimentos
consolidados em um artigo publicado no periódico PNAS.
As pesquisas foram
realizadas online e envolveram 1,6 mil respondentes, que leram textos sobre
mudança climática com foco no passado ou no presente, além de textos-controle
sobre outros assuntos. Também foram usadas imagens que poderiam refletir
mudanças na paisagem que já aconteceram ou simulações de alterações previstas.
“Comparações com o passado eliminam grande parte da divisão
política que separava as atitudes dos respondentes liberais e conservadores em
relação à, e o comportamento para com, a mudança climática”, escrevem os
autores, dos Estados Unidos e Alemanha: as conclusões do "paper" apontam que o apelo ao passado permite cobrir "lacuna política" entre liberais e conservadores no que diz respeito à mudança climática numa média de 77% das vezes.
Num dos experimentos, onde os respondentes eram estimulados a doar dinheiro para ONGs, ficou claro que conservadores preferem apoiar grupos que focalizam seus apelos em comparações com o passado, enquanto que liberais preferem doar para ações que usam exemplos focados no futuro.
Esse trabalho vem se somar a outros que já vinham apontando a conexão entre crenças e valores -- é mais fácil a uma pessoa, que adere a um certo valor A, aceitar uma crença B se ela lhe parecer compatível com A -- e, também, a estruturação das crenças em redes, em que a conexão lógica ou afetiva entre uma nova crença proposta e as crenças pré-existentes pode fortalecer ou enfraquecer sua chance de adoção.
Há até um estudo sugerindo que as pessoas são capazes de considerar alegações contraditórias entre si igualmente plausíveis, desde sejam, ambas, compatíveis com uma crença mais ampla -- por exemplo, pessoas que acreditam que o governo americano mente sobre terrorismo podem achar "altamente provável" tanto que Osama bin Laden ainda está vivo quanto que ele já estava morto muito antes de sua execução ter sido anunciada.
Confesso que vejo trabalhos como esse da comparação entre "exemplos do passado" versus "exemplos do futuro" com um certo grau de ambiguidade ética: há uma zona nebulosa entre a persuasão emotiva e a desonestidade intelectual. Exemplos deveriam ajudar as pessoas a pensar sobre o que está sendo discutido, não distraí-las da questão em tela.
No entanto, não há nada de essencialmente errado em enquadrar uma mensagem de modo adequado para o público que se pretende atingir. De fato, é possível argumentar que o que mais se precisa hoje do mundo é de uma maior preocupação com esse tipo de enquadramento, ao menos da parte de quem acredita ter causas importantes a defender: certas pessoas convencem-se fácil demais de que a pureza e a urgência de sua causa fulguram de tal modo nos céus do Novo Mundo que quem não as enxerga de imediato é cego, idiota ou inimigo.
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